26/03/2019

Apaziguar o ego


Não gosto de funerais, 
não é que a morte me faça espécie, 
muito pelo contrário 
nunca fui de grandes medos. 
Mas se há ocasião que não me move são funerais, 
não é a cerimónia que é descabida 
Ou algo que se possa categorizar, 
por norma são as pessoas 
que me lembram o motivo pelo qual evito ir. 

Há sempre quem chore a falta de alguém, 
quem a sinta e quem a negue. 
Há quem passe de visita 
e deixe flores. 
Mas também há quem queira fazer-se mostrar 
para mais tarde poder cobrar. 
Há quem se destine por respeito à família 
e aos amigos, 
É o que dizem ou será o peso da obrigação a empurrar? 

Enquanto há quem celebre o seu propósito, 
há quem ache que a cerimónia é para os vivos 
para apaziguar o próprio ego. 
Há quem se limite a ver do lado de fora 
enquanto falam da vida que levou 
e muitos nem o nome lhe sabem. 
Há ainda quem tema não ter nada para lembrar amanhã, 
e quem amanhã nem se lembre da sua existência. 

Não gosto de funerais 
porque ir a funerais é um ato de egoísmo. 
As pessoas não vão com o propósito de demonstrar o amor que lhe têm, 
vão reclamar o amor que deixaram de poder receber. 
Se reconhecer fosse a sorte que puderam ter, 
talvez não evitasse ir a funerais.

4 comentários so far

  1. Esta publicação está, de certa forma, intensa e faz refletir. Concordo em grande parte contigo, pois, acho que em algum momento da nossa vida acabamos por aí ao funeral de alguém porque "fica bem", porque conhecemos a família, porque em algum momento nos cruzamos com a pessoa e não propriamente porque ela era importante para nós - talvez aqui se denote algum egoísmo.
    No entanto, não considero que seja apenas isso, um ato de egoísmo, mas sim, também, uma forma de nos despedirmos de alguém. Não sei. Acho que um funeral pode simbolizar muita coisa, dependendo das relações entre o falecido e quem vai. Embora não diminua o luto ou a saudade, ajuda-nos a perceber que acabou, que nunca mais iremos poder estar com aquela pessoa.
    Um beijinho

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    1. Não é que seja sempre um ato de egoísmo ou pelo menos não o seja em todas as situações, mas há sempre alguma vez que o é. E se atribuirmos percentagens aos motivos pelos quais as pessoas vão, a maioria é só porque sim. E é por isso que digo que é um ato de egoísmo. Porque há quem não tenha qualquer motivo para se ir "despedir" ou seja o que for que cada um interprete que seja um funeral - é só isso que refiro, nada mais. Até porque cada um é singular e as ligações entre todos são diferentes.

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  2. Não gosto de funerais, fui ao do meu avó, mas não entrei. Não me peçam para ir, porque não quero.

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    1. Ir ou não ir não define o sentimento que temos pela pessoa. Acho que sermos sinceros connosco próprios e não cedermos a obrigações é uma demonstração mais bonita, porque estamos a ser realmente nós.

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