12/07/2018

As palavras nem sempre são suficientes


As palavras escapam e por vezes enganam. E eu que nunca fui de muitas palavras, embora viva de conversas em folhas brancas, esferográfica na alma e sentimentos à flor da pele, o encanto das palavras sempre me conseguiu dar a volta à cabeça. Grito. E peço que gritem também. Comigo ou sozinhos. Mas Gritem. Atropelem os sentidos e a alma, sem deixar vestígios de tentativas falhadas, de bocas trémulas que sem saberem o que dizem vão aclamando aos ventos o rumo certo debruçado sob os medos que marcam a alma pejada de nós bastardos. E respirem o sufoco do ar poluído pelas vozes arrastadas de uma humanidade saturada do vazio da impossibilidade de conjugar o verbo "ser" e "poder", em livre arbítrio. E gritem novamente.

A luz cega-nos, a escuridão da noite ainda mais. E nós deixamos que nos controlem as capacidades, os desejos e as virtudes. Gritem. Gritem contra isso, não deixem que vos amarrem as mãos, nem vos atem os braços. Não deixem que vos calem com falácias embebidas em bolas de neve como na política. E tentem mesmo que as consequências doem.

Mesmo em tentativas de encontrar o meu pulso nos batimentos que estremecem a minha lucidez, cerro as mãos em volta da esferográfica para que não me vejam de pensamentos cheios. E escrevo rascunhos sórdidos sobre a plenitude da vida e o desconhecido. A consciência foge-me por dias e tende a chegar por humildes noites. Não insisto em águas calmas quando ao meu redor as pessoas correm atrapalhadas por vidas pouco demoradas, abafadas nas suas hipocrisias mínimas, e entre esperas e vindas, de tudo o que não espero, de dores e amores, continuo a escrever sobre os oceanos e o universo paralelo. De olhos cansados, sentada no chão esbaforida de ver futuros mortos à nascença, coloco no caderno um ponto e uma vírgula dia sim, dia não. Se todos soubéssemos o quanto as palavras correm brutas e cruas por todos as quinas, a liberdade da vida estaria na conjugação do verbo "abraçar", "incluir" e "criar", ao invés de se resumir ao verbo "tentar".

03/07/2018

Somos todos átomos num acelerador de partículas


Somos pensamentos difusos no silêncio da escuridão numa vida de refugiados.

Tudo nos transcende e tudo nos foge da razão, mas dizem por aí que os ventos trazem a nossa sorte num dia qualquer quando permitirmos acolher a esperança na nossa alma. Não se pode acolher amor ou esperança quando não se consegue sequer entrar dentro do próprio corpo e ver para além do seu ser em personagem assistente de uma vida cheia de tanto ou de nada. Viver é um vácuo ou um universo cheio de estrelas onde se aposta forte e feio que possa ser cheio de tudo. Ou, no mínimo, devemos a nós próprios, a eventualidade de tentar acreditar que o possa ser, mesmo que seja apenas uma mera possibilidade alienada para justificar o medo que temos de encarar a adrenalina sentida todas as vezes que as peripécias são atingidas por meteoritos. E apesar de fugirmos continuamente a sete pés, a cada vez que colidimos, existe uma sensação incomodativa de que está errado não tentar saborear a sensação do embate. Mas também não é certo. Mas sempre se foge. Mesmo quando nos enfrentamos, há sempre algo a perder, há sempre algo ao que fugir.

Percebemos constantemente que não vivemos na mesma sintonia, mas são os átomos distintos que nos unem numa só harmonia, porque as igualdades dão-nos alegrias, e as particularidades de cada um definem-nos e tornam-nos únicos no planeta. E é quando damos um passo atrás que percebemos que são as nossas diferenças que nos fazem conectar com lugares, pessoas e sentimentos. Que são as nossas desigualdades que nos fazem pessoas mais fortes e lutadoras, são as nossas dissemelhanças que nos oferecem vidas características, que vistas do universo se parecem tão iguais. Somos partículas universais solidificadas na Terra e incompatíveis umas com as outras mas que se transferem de polo para polo na esperança de um dia formar uma partícula estável. A vida muda a cada milésimo de segundo - a instabilidade das energias veem-se ao redor de cada corpo ambíguo que procura o futuro sob as poeiras que se arrastam discretamente pelos ombros e o peso da gravidade que nos puxa para a Terra sem autorização.

Tudo nos parece uma questão de oportunidade, mas a vida não dá oportunidades como quem estala os dedos. As oportunidades são construídas com as diferenças que nos deram, com os gostos que descobrimos, com as capacidades com que nos criaram e com a personalidade com que nascemos e aperfeiçoamos.  As igualdades pouco nos valem a não ser meia dúzia de temas de conversa com os amigos que as diferenças nos possibilitaram ter. 

Ainda assim continuamos a fugir...

Devemos olhar para o outro e procurar mais vezes um pouco de nós, porque são as nossas diferentes energias que permitem a criação de ligações. Propagar o autoconhecimento é permitir viver mais o outro e compreende-lo na diferença da igualdade que somos - a humanidade trás a estabilidade que procuramos a vida inteira.
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